A reconhecida maestria de Jesus nos Seus
ensinamentos, com a particularidade de Sua presença, com Sua força
incomparável de interpelação, tocava sempre os espaços mais recônditos
dos corações. O evangelista Marcos narra um diálogo de Cristo com Seus
discípulos que causou grande espanto. Jesus descreve a cena de alguém
que corre na direção d'Ele e, quando se aproxima, pergunta: “Bom Mestre,
que devo fazer para ganhar a vida eterna?” O diálogo se desenvolve
aprofundando o que é ser bom e o que fazer para ser bom, admitindo
convictamente que a conquista da plenitude do ser humano só se faz
quando se encontra e se percorre o caminho da bondade.
Depois de falar dos mandamentos para
aquele que estava interessado em ganhar a vida eterna, Jesus, fitando-o
com amor, afirma: “Só uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens, dá
o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e
segue-me”. O interessado na vida eterna ficou pesaroso e foi embora
cheio de tristeza, pois possuía muitos bens, conta o evangelista Marcos,
que também descreve o espanto dos discípulos ao ouvirem estas palavras
de Cristo. Pedro, então, intervém dizendo: “Olha, nós deixamos tudo e te
seguimos”.
Jesus não estava fazendo contas de
números naquele diálogo. Sua maestria não se prendia, na verdade, a
quantidades de bens. Ele tocou no núcleo central interior que rege os
rumos dados à vida: a capacidade de discernimento e escolha, a
competência para produzir sentido, a convicção simples e determinante de
que é bom ser bom.
Ser bom é ser honesto. É alavancar projetos que produzem vida e fecundam a cidadania com valores, que não se reduzem às posses.
Trata-se de princípios que alargam horizontes. O desafio maior, em
todos os tempos, inclusive agora, na cultura contemporânea, é superar
uma compreensão da vida que a reduz aos números e aos bens materiais.
Aliás, esse desafio é ainda mais urgente no tempo em que vivemos, porque
há uma avalanche de mudanças, intensificada pelo universo virtual da
informação.
Manter a serenidade indispensável e
alavancar-se na sabedoria necessária não é fácil. Fácil é perder o rumo.
Vive-se uma oscilação entre a impotência da crítica e a onipotência da
opinião. Esta oscilação provoca inevitavelmente a perda de referências e
de valores. O Papa Bento XVI adverte aos fiéis de que a cultura
contemporânea corre riscos de excluir Deus, fonte única e inesgotável de
princípios, dos próprios horizontes. Assim, a humanidade segue
caminhos equivocados, receitas destrutivas. Sem Deus no horizonte, o que
se constata é a primazia da instabilidade no lugar da verdade. A
informação, com sua fluidez, passa a ser fonte de todas as fontes.
É preciso saber que não basta estocar,
organizar e distribuir informações múltiplas. Mesmo diante dessa grande
oferta de conteúdo, pergunta-se: o que no mundo de hoje é justo, bom,
verdadeiro? Não encontrada a resposta, experimenta-se o peso da
existência. A vida fica à mercê de relatos sobre relatos, prostrando os
humanos na insatisfação, tornando-os insaciáveis. Mas, ávidos não dos
valores que sustentam e devolvem a serenidade. Em cena, de novo e
sempre, a necessidade da permanente busca e do reger-se por princípios.
Um movimento que dá sustentação à cultura, caminha na direção da
correção de descompassos. É saída na superação da violência, correção
para a ganância que gera o veneno da corrupção e a loucura da posse.
Este é o permanente desafio diante de
um cenário que causa medo e que mina a convicção simples de que é bom
ser bom. Vale lembrar, mais uma vez, o Papa Bento XVI quando diz que o
encontro com uma Pessoa, Jesus Cristo, dá novo horizonte à vida e, com
isso, uma orientação decisiva. É hora do diálogo com Jesus, para
iluminar gestos que fazem a diferença.
Dom Walmor Oliveira Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte (MG)
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